Compromisso centenário

A história do Hospício D. Maria Amélia é também a história da ligação entre a Madeira e a Casa-real Sueca.

Quando a rainha Sílvia da Suécia chegou à Madeira, no passado dia 2 de maio, para a inauguração de um novo edifício no Hospício Princesa D. Maria Amélia, com ela trouxe um compromisso com mais de cem anos de história, o mesmo período que a família real sueca apoia aquela instituição.

A razão dessa ligação começa do outro lado do atlântico, precisamente no Rio de Janeiro, com a chegada de Amélia de Leuchtenberg ao Brasil, em 1829.

Com apenas 17 anos, D. Amélia casou-se com D. Pedro I do Brasil e tornou-se imperatriz. Da relação com o monarca nasceu, já em continente europeu, nasceu a frágil Maria Amélia de Bragança, em 1831.

Órfã de pai aos três anos de idade, Maria Amélia foi criada em Portugal, onde a meia-irmã, D. Maria II,  era rainha e viveu em Lisboa até 1852, quando os primeiros sintomas da tuberculose começaram a aparecer.

Desde o século XVIII, os ares da Madeira tinham sido identificados pelos médicos ingleses como tendo propriedades especiais para a cura da tísica, nome pelo qual era conhecida, na altura, a tuberculose.

“Há de facto, na primeira metade de 1800, um médico inglês, o James Clark, que diz que o melhor clima do mundo para curar a tuberculose é a Madeira”, afirma o arquiteto Rui Campos Matos. Terá sido a partir daí que começou a verdadeira procura da ilha pela aristocracia europeia.

A verdade é que, muitos anos depois, verificou-se que os “ares da ilha” e as suas condições não eram favoráveis a doentes com problemas pulmonares, muito por causa da humidade existente.

Naquela altura, é na esperança de uma recuperação que, já em estado avançado de doença, a jovem Maria Amélia chega à Madeira, a 28 de agosto de 1852, na companhia da sua mãe. Viria a falecer pouco depois, a 4 de fevereiro de 1853.

É comum na nossa história o romantismo e o luto andarem de mãos dadas. os casos de “Píramo e Tisbe”, de Ovídio, e de “Romeu e Julieta”, de Shakespeare, são exemplo onde a tragédia e o amor misturam-se e criam algo de novo.



Apesar de ser um diferente tipo de amor, neste caso o maternal, a história do Hospício na Madeira também junta os dois ingredientes, que são temas recorrentes na literatura e no cinema.

Após a tragédia da morte da sua filha, D. Amélia quis homenagear a ilha pela forma como tinha sido recebida. Em memória de Maria Amélia, mandou construir um sanatório para a cura de doentes com tuberculose.

Após a aquisição do terreno, situado na hoje conhecida por Avenida D. Infante, a primeira pedra foi lançada em 1856. Seis anos mais tarde, o Hospício D. Maria Amélia acolhia os seus primeiros doentes.

Em Lisboa desde a morte da filha, D. Amélia morre em 1873 sem nunca ter visitado o hospício que tinha fundado e sem deixar bases financeiras sólidas que pudessem manter o projeto. Por testamento, essa tarefa foi incumbida à sua irmã Josefina, rainha da Suécia. Anos mais tarde, a responsabilidade passou para o herdeiro do trono sueco, o rei Óscar.

Foi através dele, após uma visita à ilha e ao hospício, que as bases de apoio ao projeto, através de uma fundação perpétua, foram lançadas.

O primeiro sanatório português apoiado pela Casa-real Sueca é um edifício neoclássico de estilo inglês, com inspiração nas casas de estilo georgiano dos finais do século XVIII, inícios dos séculos XIX.

A escadaria que dá acesso à entrada principal e o frontão impressionam, ladeados por uma fachada quase simétrica. A chegada ao edifício é feita como uma viagem no tempo, através dos jardins circundantes, que se encontram abertos ao público em geral.

Hoje em dia, apesar de já não funcionar como asilo hospitalar para tratamento de doenças pulmonares, o edifício tem agora um orfanato, uma escola e um lar de idosos, continuando, assim, a dar um importante apoio na vertente social da ilha.

Durante a cerimónia de inauguração, no passado mês de maio, a rainha que referiu com é “orgulho” que a família real “continuará a apoiar esta instituição”, num compromisso já centenário. O novo espaço, anexo ao lar e ao edifício principal, tem agora uma capacidade total para 40 residentes, divididos em 16 quartos individuais e 12 duplos, e destina-se a apoiar os mais idosos.