Patek Philippe

Com mais de 175 anos, a Patek Philippe mantém-se como um caso à parte e um verdadeiro campo de sonhos para colecionadores e apreciadores.

A Patek Philippe é para muitos uma marca misteriosa, se não conhecerem bem a sua história. Principalmente se desconhecerem os momentos marcantes que lhe deram o estatuto invejável que hoje ocupa entre colecionadores e apreciadores de alta relojoaria.

E, já agora, por que não acrescentar a este grupo alguns investidores que, cada vez mais, optam por juntar a alta relojoaria à arte nos seus portefólios de investimento. Bastará folhear alguns catálogos da Christie’s, Sotheby’s ou Antiquorum dos últimos dez anos para comprovar a evolução de preços e perceber do que falamos.

Mas voltemos ao essencial – os extraordinários relógios que a manufatura de Genebra tem vindo a construir desde há precisamente 175 anos, bem como os colecionadores que deram corpo e expressão ao estatuto que a maison hoje usufrui internacionalmente. Resumir nestas poucas páginas quase dois séculos de história seria, à partida, uma tarefa condenada ao fracasso, pelo que talvez seja preferível navegar por alguns dos pontos mais altos da sua história, em que muitas vezes o relógio e o colecionador são inseparáveis um do outro.

É inequívoco que hoje a Patek Philippe consegue seduzir muitos pelo facto de ser das poucas manufaturas, se não a única, a ter uma história ininterrupta desde a fundação em 1839. A isto acresce o facto de, ao longo deste período, se ter mantido em mãos privadas e de, consequentemente, ter transformado essa estabilidade numa filosofia de qualidade e perfeição contínuas, difícil de replicar.

Construído pouco tempo depois da criação da empresa, e apesar de totalmente renovado em 2006, o edifício histórico na Rue du Rhône de Genebra continua lá, assim como o nome Patek Philippe, inscrito na fachada. A base que distingue a manufatura de muitas outras tem essencialmente a ver com valores fundamentais que a empresa respeita, como a organização, e que sempre se confundiram com o carácter dos seus proprietários, os Patek, Philippe e Stern.

Ao contrário de muitas outras manufaturas, a elevada qualidade intrínseca dos relógios que a Patek Philippe constrói é uma característica que surgiu com a própria fundação, integrando desde o primeiro dia o escalão mais elevado da alta relojoaria, através de uma sucessão de modelo complicados com repetição de minutos. Um atributo que ao longo de 175 anos não se alterou e que consequentemente teve de fazer parte do espírito dos seus fundadores, descendentes e da própria família Stern que, em 1932, adquiriu a empresa após longos anos de estreita relação como fornecedora de mostradores.

Essa paixão pela perfeição, precisão e história está traduzida de forma inédita no museu Patek Philippe em Genebra, onde se expõe uma das maiores coleções privadas de relojoaria do mundo, adquirida ao longo de décadas por Charles e principalmente Philippe Stern, respetivamente avô e pai do atual presidente, Thierry Stern.

Uma paixão que está também patente na forma como cada relógio Patek Philippe é pensado e criado, e que justifica a extensa lista de numerosos regentes, chefes de estado, dignitários clericais, magnatas da indústria e proponentes da arte e da cultura, que, desde o século XIX, escolheram a marca relojoeira para si ou para agradar a outros.

Antoni Norbert de Patek, o nobre polaco que fundou a maison, e que viria a associar-se ao relojoeiro francês e inventor Jean Adrien Philippe, teve certamente uma ideia clara de quem seriam os seus clientes. Um dos exemplos mais conhecidos ocorre em Londres onde, em 1851, durante a Grande Exposição no Palácio de Cristal, a rainha Vitória adquire um repetição de quartos de bolso com escape de cronómetro para oferecer ao Príncipe Alberto. A compra não passa despercebida e gera um enorme reconhecimento à manufatura. Alguns anos depois é o Papa Pio XII que adquire um repetição de quartos sobre dois gongos onde manda gravar “Pater, Rex/Dirigas Intelligentias/ /et/corda/Geneva 29 Junii 1867”.

Sucede-se o exemplo do primeiro relógio de pulso da manufatura, que é vendido à excêntrica condessa húngara Koscowicz, em 1876, e de uma série de personalidades que, possivelmente, apenas Breguet poderá ter suplantado no seu tempo. Mas a aventura mais fascinante prende-se definitivamente com as grandes complicações que a Patek Philippe começou a produzir ainda antes do final do século XIX, associadas a uma elite industrial que despontava na América do Norte. A construção do primeiro modelo deste género foi concluída em 1898 e envolveu Stephen S. Palmer, um conhecido industrial norte-americano a quem a grande complicação número 97912 foi entregue em 1900.

O relógio de bolso com sete complicações terá provavelmente sido o início de uma posterior disputa de cavalheiros pelo título de relógio mais complicado do mundo. Um desses cavalheiros foi James Ward Packard, inventor e pioneiro da indústria automóvel, fascinado pela medição do tempo e, em particular, por modelos com complicações acústicas.

Entre 1912 e 1927, Packard encomendou uma sucessão de relógios complicados à Patek Philippe, variando no tipo de funções e número de complicações, entre os quais um modelo com 16 complicações que à data, em 1916, era o relógio mais complicado do mundo. Noutras ocasiões, Packard exigia a conjugação inédita de complicações, como foi o caso da primeira associação entre uma repetição de minutos e um turbilhão, em relógio que lhe foi entregue em 1919.

Tal como Packard, o financeiro Henry Graves Jr. deixou-se fascinar pela vertente complicada da relojoaria, mas deu inicialmente ênfase especial à precisão, ao preferir, de forma quase obsessiva, relógios com certificados emitidos por observatórios astronómicos.

Os modelos vencedores dos habituais concursos de precisão, organizados por esses observatórios, acabavam por ser o motivo de uma perseguição sem reservas até, por fim, se encontrarem na sua posse. E se, no total, Packard deve ter encomendado cerca de 40 peças à Patek Philippe e Henry Graves Jr um número a rondar as 80, é a encomenda deste último, em 1925 - uma supercomplicação com nada menos que 24 complicações - que coloca definitivamente um fim à disputa.

Não só porque se tinha alcançado o limite do que era possível produzir à época sem recurso aos modernos meios atualmente disponíveis, mas porque cinco anos antes da entrega do relógio, a morte de Packard retirava a Henry Graves Jr o elemento de disputa que instigara a aventura. Graves recebeu a supercomplicação a 19 de janeiro de 1933, oito anos depois de a ter encomendado à Patek Philippe. 

Tratava-se do relógio mais complicado do mundo, um título que seria sempre contestado pelo Leroy 01, adquirido em 1900 pelo colecionador português António Carvalho Monteiro. A disputa foi resolvida em 1989, o ano em que a Patek Philippe festejou o 150º aniversário, quando, pela primeira vez, apresentou uma coleção comemorativa. A coroar as diversas peças apresentadas para a ocasião, a manufatura revelou o extraordinário Calibre 89 que, com as suas 33 complicações e 1278 componentes, dissipou definitivamente todas as dúvidas sobre qual o relógio portátil mais complicado do mundo.

Passados 25 anos, em 2014, comemoram-se os 175 anos da Patek Philippe e, mais uma vez, a manufatura decide marcar a efeméride com uma coleção de peças de edição limitada. Entre as numerosas peças apresentadas estão as referências 4675 e 5975, dois belíssimos cronógrafos com tripla escala de taquímetro, pulsómetro e telémetro, e as referências 5575 e 7175, que acrescentam à indic ação de horas do mundo uma grande indicação de fases da lua ao centro do mostrador, bem como a referência 5275.

Este último é um relógio com caixa tonneau e indicação de hora digital saltante, assinaladas de forma sonora en passant, uma especialidade que a Patek Philippe deixara de construir em 1920, e para a qual desenvolveu agora um calibre totalmente novo, o 32-650 HGS PS, com 438 componentes e quatro patentes.

Estes modelos, apesar de marcantes, não expressam o grau de exclusividade e sofisticação alcançado com a supercomplicação de Henry Graves, o Calibre 89 ou mesmo o Star Caliber 2000, um outro relógio de bolso ultracomplicado (21 complicações) lançado para comemorar o novo milénio. A expectativa gerada antes da apresentação da coleção comemorativa sobre qual seria a pièce de résistance escolhida pela Patek Philippe para coroar o seu 175º aniversário é finalmente satisfeita com a revelação da referência 5175 Grandmaster Chime.

A surpresa é enorme, já que poucos tinham antecipado que a manufatura genebrina optasse por um relógio de pulso, ou que tivesse desenvolvido uma complicação totalmente nova para este modelo. Construídos apenas sete exemplares, o Grandmaster Chime é uma grande complicação de pulso com nada menos que 1366 componentes e 20 complicações, cujas indicações foram distribuídas por dois mostradores na frente e verso do relógio.

A lista de complicações incorporada pelo novo calibre 300 em pouco mais de três centímetros cúbicos de mecanismo é admirável e inclui, entre outras, grande sonnerie, petite sonnerie, repetição de minutos, alarme por repetição, reserva de corda para o relógio e complicações sonoras, segundo fuso horário com indicação de dia/noite, calendário perpétuo instantâneo, fases da Lua e, talvez a mais surpreendente de todas, uma repetição de data.

Esta última complicação reproduz de forma sonora, e a pedido, a data do calendário perpétuo através de uma dupla batida grave para cada múltiplo de dez e uma batida aguda, única, para cada unidade. A nova complicação dá ao Grandmaster Chime o título de único relógio no mundo a incorporar três tipos distintos de indicação sonora. Que outras maravilhas nos irão reservar a Patek Philippe para as comemorações do 200º aniversário em 2039? Thierry Stern, o atual presidente da manufatura revela apenas que já há planos em marcha e que, até lá, uma coisa é certa: a Patek Philippe continuará a ser um garante das mais puras tradições na alta relojoaria e a fazer sonhar ano após ano um grupo cada vez maior de verdadeiros devotos desta excecional manufatura.